sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Sempre Cineas

História Inconclusa



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Embora não goste de viajar, agrada-me visitar Caxias (MA), cidade que tem tudo a ver com Teresina. Para os menos informados, Saraiva não plantou a capital do Piauí nesta chapada árida apenas pela beleza do lugar. Seu objetivo era neutralizar a influência econômica de Caxias na região norte do Piauí. Não bastasse isso, a “Princesa do Sertão” tem uma bela história que remonta ao início de século XVIII quando se chamava Guanaré. Da imponência do passado, sobrou pouco, apenas o bastante para encher os olhos de um aldeão lírico.

Na semana passada, voltei à terra de Salgado Maranhão para participar da VI edição do Salão do Livro de Caxias, evento que só se realiza graças à saudável obstinação da profa. Joseane Sousa, uma cidadã na acepção plena do termo. Joseane prova que uma andorinha, quando agregadora e competente, pode fazer não apenas um verão, mas uma luminosa primavera.

Por amor à verdade, devo confessar que, além da alegria de rever os amigos caxienses, animava-me a possibilidade de rever uma indiazinha – linda de viver – que “descobri”, há pouco tempo, quando regressava de Coelho Neto. Vendia redes na beira da estrada. Por mais que me esforçasse, não pude pescar-lhe o nome. Chamei-a então de Smile, homenagem ao seu sorriso de acender manhãs. Por sugestão dela, comprei uma rede cor de tangerina que, para mim, será sempre uma rede amanhecente...

Na ida, a pressa impediu-me de parar para procurá-la. Na volta, parei na rústica barraquinha onde o colorido das redes e das frutas enchem os olhos de quem sabe ver. Uma senhora curtida pelo tempo atendeu-me com presteza. Comprei manga, caju, tomei um café choco, alinhavei uma conversa insossa sobre chuvas e outras amenidades. Para minha tristeza, nem sinal de Smile. Na verdade, espichei aquela prosa descosida na expectativa de rever a indiazinha que, em outro momento, já me rendera uma crônica. Desacorçoado, despedi-me da vendedora, mas, com ensaiado desinteresse, joguei o anzol: há poucos dias, comprei uma rede a uma indiazinha que trabalhava aqui. O que é feito dela? A velha fez um muxoxo e declarou: “Moço, índio é bicho de veneta. Só faz o que quer. Ninguém tem comando sobre eles. Ela deve andar por aí, virando bicho nesses mofumbos”.

Pelo tom, vi que a velha senhora não tinha o menor apreço pela índia a quem eu pretendia oferecer um livrinho de poemas. Pensei em deixar o livro com a vendedora, mas, seguramente, ela não o entregaria à destinatária que, talvez, nem saiba ler. Sem a menor originalidade, repeti o gesto do personagem Arturo Bandini em “Pergunte ao Pó”: afastei-me uns cem metros, adentrei o mato ralo e atirei o livrinho ao acaso. Nas suas reinações, Smile há de encontrá-lo, tenho certeza. Se não souber ler, nenhum problema: um analfabeto pode melhorar qualquer livro, lendo nele o que a imaginação for capaz de criar. Assim seja.

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