quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Dallari, mensalão e engajamento

Dalmo Dallari
O jurista Dalmo Dallari veio a Teresina. Aqui, do alto de sua sabedoria, deu sua opinião sobre o julgamento do mensalão: “É apenas um processo, com a particularidade de ter muita gente envolvida e alguns militantes políticos, mas fora daí, não vai trazer grandes novidades para a realidade brasileira”.
Para o eminente jurista, o julgamento é só mais um. Não mudará a realidade brasileira, afinal o que está em jogo é só o destino de alguns militantes políticos e de “muita gente”. Sem perder a oportunidade, ataca: “O julgamento do mensalão não tem a importância que a imprensa tem dado, não vai trazer nenhuma jurisprudência nova, não vai ter importância fundamental para a correção das práticas políticas brasileiras”.

Preocupa-me o alinhamento ideológico de algumas figuras que ocupam posições de destaque no meio intelectual. O alinhamento do Dr. Dallari é preocupante, a ponto de levá-lo a desprezar um fato jurídico, histórico e político desta envergadura.

Na última campanha eleitoral para presidente, o jurista, junto com a filósofa Marilena Chaui, liderou um ato público em defesa da candidatura de Dilma Rousself nas dependências da lendária faculdade de direito do Largo São Francisco. Um ato ilegal, uma vez que se trata de uma instituição pública, que não deve ser utilizada para manifestações político-partidárias.

O julgamento do mensalão, Sr. Dallari, tem, sim, importância visceral; apresenta-se, sim, como um marco para as nossas instituições, um paradigma que servirá para, de uma vez por todas, esclarecer se os poderosos de turno são passíveis de sofrer os rigores da lei, ou se o nosso sistema legal não os alcança.

Não vai produzir jurisprudência? Como não!!! Vai, sim. Vai, por exemplo, como está se vendo, apontar que não é necessário, para caracterizar o crime em tela, um ato de ofício do agente perpetrador do tipo penal contra a administração pública, como quer demonstrar a defesa dos réus.

A afirmação - tacanha, diga-se - de que são meros militantes políticos que estão sendo julgados é de doer. Quem está no epicentro da denúncia é nada menos do que a cúpula de um partido que governa o país há mais de 10 anos, cujos membros se apresentavam como vestais, como detentores da chave de um futuro promissor, longe das práticas mais nefastas já inventadas pela antiga elite política do país.

Toda vez que me deparo com certos alinhamentos ideológicos, que embotam o pensamento, lembro-me de uma imagem que ilustra a capa do livro “Mente Cativa”, do pensador polonês Czeslaw Milosz, prêmio Nobel de Literatura de 1980.

 Na capa, uma imagem - cabeça de uma estátua de um ditador, estatelada no chão, com um livro atado a ela - que simboliza certos adesismos, certas posturas que demonstram bem o espírito de um tempo.

Li o livro já há algum tempo. Guardei muita coisa. Quando me deparei com as afirmações do mestre Dallari, na entrevista concedida a um jornal local, aquela imagem me invadiu, tornando claro que a pior iniciativa de um intelectual é aderir a uma luta política cega, contrariando fatos e evidências.

O mensalão do PSDB de Minas vai ser julgado. Os indícios são veementes de que houve, realmente, todo um esquema fraudulento comandado pelo Tucano Eduardo Azeredo.
Quem sabe, assim, o mestre Dallari empreste importância aos fatos. Aí, sim, coincidiria a sua militância política com sua qualidade de jurista. Enquanto isso, ele prefere apontar os excessos da, como é mesmo?, mídia golpista, para descaracterizar um dos mais importantes casos que o Judiciário já se deparou. Triste.

Zeferino Júnior

Nenhum comentário:

Postar um comentário