sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Dário, o talentoso

O louco

Muito bom. Dário escreve como gente grande. É um talento.



Um louco disse:

“Não são raras as vezes que quem aponta o dedo quer tão somente que os olhos mirem qualquer coisa que não o seu próprio dedo sujo.

Aquele, meus amigos, que insiste em se dizer bom e justo e humilde e espirituoso e a fustigar as ingenuidades alheias para que acreditem na sua pureza e boa intenção, dificilmente será algo mais que um calhorda.

E o trejeito mais humano de um calhorda é a soberba. Ornamentada por uma gravata e deliberadamente disfarçada num discurso altruísta com sintomas de bondade religiosamente pensada, esta soberba estampa um sorriso cheio de si no rosto do seu hospedeiro.

O calhorda se perde no emaranhado de suas mentiras e numa colérica pressa atropela a civilidade e a deixa clamando por socorro. Sem vergonha nenhuma, ele se diz a própria verdade e benevolência e dorme tranquilo no final do dia, pois o calhorda não se importa.

O calhorda é caricato, exagerado e desbocado. Não poupa palavras, tampouco a paciência de quem o enxerga além do sorriso falso e interesseiro. Ele acusa, diz e desdiz sem se importar com o mal que causa a quem quer que seja. Mestre de um maniqueísmo virulento, o calhorda vai sempre se esconder atrás do seu ofício e apontar o dedo para longe de si quando um olhar atento e incrédulo se insinuar para ele.

Todas as manhãs o calhorda pigarreia mentiras mal dormidas e, baixo que é, enxerga-se no alto de um palco e diante dos holofotes e de um público estupefato com a grandeza e bondade que ele encena com farsante maestria.  

Enganam-se, porém, o ponderado e o pragmático que questionam como revelar a teatral anunciação desse falso herói dos desavisados. Enganam-se ao questionar o teatro enquanto deveriam se voltar tão somente para a plateia entusiasmada. É lá, entre milhões de olhares congelados, que brilha a luz do calhorda. É lá que o teatro se torna realidade.   

Nada há a se fazer a não ser esperar que a soberba transborde no ego do calhorda e este enseje, enfim, uma aventura tão insólita, estapafúrdia e inverossímil que, aos poucos, poucos olhos vão se arregalando até se negarem a acreditar em tanta mentira.

Então o calhorda perderá o sorriso, mas não antes de se esconder das luzes e dos olhares que tanto o inebriavam!

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