sábado, 11 de agosto de 2012

O futuro do menino de prata


O futuro do menino de prata


Perdida mais uma vez a medalha de ouro no torneio olímpico de futebol, nas circunstâncias que todos viram pela televisão, chegou a hora de olhar para o futuro de Neymar. Depois de ter falhado na Copa América no ano passado, ele foi para a Inglaterra com seus dezessete companheiros de equipe em meio a algumas dúvidas inquietantes.

Voltaria a exibir o talento e a capacidade de desequilibrar partidas que mostrou no Santos em 2010 e 2011, ou continuaria irregular como em boa parte desta temporada? Teria dominado seu gênio impulsivo e os faniquitos de garoto mimado, resistindo às pressões em uma competição na qual para o Brasil interessava apenas o título, ou voltaria a perder a cabeça em momentos decisivos e daria razão a Maradona, que certa ocasião o chamou de “menino mal educado”? Insistiria em simular faltas ou iria para o caminho mais difícil, e eficaz, de prosseguir na jogada em direção ao gol? Com um rendimento mensal estimado em 3 milhões de reais, graças sobretudo a seus dez patrocinadores principais, teria perdido um pouco da motivação para buscar árduos desafios? E, finalmente, deixaria de lado as jogadas de efeito, o individualismo – o que levou Pelé a afirmar que ele andou jogando “mais para a torcida e para a televisão do que para o time” –, e passaria a se preocupar com sua participação coletiva?

Dias antes de embarcar para Londres, o treinador Mano Menezes, que ao assumir o cargo, há dois anos, convocou-o pela primeira vez para a seleção principal, refletia sobre essas questões. “O problema do Neymar foram os dois jogos em que enfrentou Messi”, analisou em uma conversa com VEJA, citando as partidas em que o Santos foi goleado pelo Barcelona por 4 a 0, na decisão do mundial de clubes, em dezembro, no Japão, e o Brasil perdeu para a Argentina por 4 a 3, em um amistoso disputado em junho nos Estados Unidos. Na primeira, o supercraque argentino Lionel Messi marcou dois gols. Na segunda, três. Em ambas, foi arrasador e brilhante, enquanto Neymar teve atuações discretas. “Perder, tudo bem, faz parte”, Mano continuou em sua análise. “O ponto é que ficou clara a diferença técnica que existe entre os dois no momento. Ele, que estava até sendo comparado ao Pelé, sentiu o baque.”

O que fazer dentro dessa situação? “Ele vai precisar de psicologia, de carinho, para erguer a cabeça”, respondeu o técnico. “E focar mais no futebol. Um jogador deve realizar treinamentos técnicos e coletivos, alimentar-se corretamente e repousar. Não pode se dispersar e aceitar todos os contratos de publicidade que lhe aparecem, inclusive os pequenos. As gravações de comercial são repetitivas, longas. Ele não precisa mais se submeter a certas coisas. Tem quer ser seletivo.”

Na Inglaterra, isolado nos hotéis da seleção, sem agentes e empresários ao seu redor, longe do iate avaliado em 15 milhões de reais e do assédio feminino, em companhia apenas do pai nas horas de folga, queixando-se de saudades somente de David Lucca, o filho que teve em um relacionamento passageiro e fará 1 ano este mês, a ficha de Neymar da Silva Santos Júnior enfim caiu. Percebeu que estava diante de uma oportunidade extraordinária e talvez não repetível em sua ainda curta trajetória, iniciada como profissional há três anos.

Diferentemente do que aconteceu nos mais recentes fracassos do futebol brasileiro nas Olimpíadas, em que as esperanças se concentravam nos pés de craques convocados dentro da cota de mais de 23 anos, como Rivaldo, Bebeto e Ronaldinho Gaúcho, ou com a faixa de campeão mundial, caso de Ronaldo em 1996, agora foi Neymar, aos 20 anos, o escalado para o papel de protagonista. Com seu corpo esguio de 1,74 metro (sete centímetros a mais do que Messi) e 64 quilos, não evitou o cai-cai. Foi vaiado pelos ingleses. 

Mas moderou nas encenações. Evitou reclamar além da conta e dominou a impulsividade. Não tomou cartão amarelo. E o fundamental: nos estádios de Cardiff, Manchester e Newcastle, empenhou-se em mostrar espírito coletivo nos cinco jogos antes da final em Wembley.

Na verdade, não tinha outro caminho: a dura e eficiente marcação dos adversários, que já conheciam o estilo e as manhas do camisa 11, diminuiu suas possibilidades de driblar, fazer firulas e tentar resolver as coisas sozinho. O resultado pôde ser medido em números. Até a triste derrota para o México por 2 a 1, em que esteve tão apagado como quase todo resto do time, havia marcado três gols – de cabeça, de falta e de pênalti – e participado diretamente de outros quatro. Ou seja, dos quinze gols assinalados pelo Brasil na fase de grupos e nos mata-matas, praticamente a metade teve seu autógrafo (a propósito, assina com caligrafia razoavelmente boa, ornamentada por alguns círculos que chegam a lembrar uma bola).

“Não sou individualista. Jogo para o time”, disse após a vitória por 3 a 0 na semifinal contra a Coreia do Sul, ao lhe pedirem que comentasse o elogio que Mano acabara de lhe fazer por sua postura em campo. Levava nas mãos duas nécessaires de grifes caras e tinha brincos de brilhante nas orelhas. Sorria feliz e confiante, como na capa da edição especial de VEJA sobre a Olimpíada de Londres, lançada no mês passado, em que envergava o chapelão de guarda real do Palácio de Buckingham, parecendo vislumbrar à sua frente o sonho de pendurar no pescoço a ambicionada comenda dourada que, de novo, transformou-se em pesadelo.

Seus desafios agora são mais uma vez enormes. Ele terá que concentrar-se no futebol e na sua carreira, vencer o trauma de perder, recuperar a autoconfiança e voltar a ser a esperança do Brasil na Copa das Confederações em 2013 e na Copa do Mundo de 2014. Apesar de tudo, o menino de prata ainda é, potencialmente, nosso maior jogador. Resta torcer para que demonstre isso na prática daqui para a frente.

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